Modularidade do conectoma cerebral em anorexia nervosa com peso recuperado e transtorno corporal dismórfico
(Brain connectome modularity in weight-restored anorexia nervosa and body dysmorphic disorder)
Publicado em Psychological Medicine em 19/7/2016
A. Zhang, A. Leow, L. Zhan, J. GadElkarim, T. Moody, S. Khalsa, M. Strober e J. D. Feusner
Anorexia nervosa, um transtorno alimentar potencialmente ameaçador de vida caracterizado por (1) auto-inanição, (2) perda excessiva de peso e (3) transtorno dismórfico corporal, no qual indivíduos ficam preocupados com falhas imperceptíveis ou mal interpretadas relacionadas a sua aparência física, estão relacionados a transtornos psiquiátricos que envolvem imagem distorcida do corpo, pensamentos obsessivos e insight pobre. Ambos (anorexia nervosa e transtorno dismórfico corporal) em geral ocorrem em conjunto, com sintomas usualmente aparecendo primeiramente durante a adolescência.
Pacientes com anorexia nervosa que apresentam insight pobre podem não responder bem ao tratamento porque falham em se conscientizar que seu comportamento e peso perigosamente baixo são prejudiciais à saúde e podem até mesmo levá-las à morte.
“Os cérebros de pessoas com anorexia nervosa que têm pouca capacidade de insight podem não gerar uma “mensagem de erro” quando ditas, por exemplo, que estão se colocando em uma situação de risco elevado por restrição alimentar severa”, afirma Dr. Alex Leow, professora associada de psiquiatria e bioengenharia no UIC College of Medicine. “Assim, é plausível que seus cérebros literalmente não acreditem que elas estejam severamente abaixo do peso e que seu comportamento restritivo seja perigoso, mesmo quando provas objetivas sugerem o contrário”.
A rede cerebral anormal em pessoas com anorexia nervosa compreende várias regiões cerebrais, incluindo o cingulado caudal anterior e o cingulado posterior (mas também nos gânglios basais e partes do córtex pré-frontal), que demonstrou em outros estudos, ser crucial para detecção de erro, monitoramento conflitivo e autorreflexão. Por exemplo, o cingulado caudal anterior está hiperativo em pessoas com transtorno obsessivo compulsivo (TOC), que podem perceber problemas onde nada existe, como pensar que a porta pode estar destrancada, mesmo depois de conferir inúmeras vezes.
“Nossos resultados sugerem que a fim de se ter insight, você tem que ser capaz de ver um conflito ou erro quando suas percepções diferem daquelas dos outros ou da realidade”, completa Leow.
“Por exemplo, em pessoas com anorexia nervosa, esse conflito poderia ser: “Eu posso na verdade estar magra demais, mesmo se eu penso que estou gorda”. Em seguida, elas precisam ser capazes de refletir sobre esse conflito e no que ele significa. Se elas conseguirem, esse insight pode levar a decisões adaptativas, tais como: “Êpa, preciso pedir ajuda para mudar meu comportamento e ficar saudável novamente”. Assim essa pessoa tem uma chance melhor de recuperar-se. “Mas sem este insight, elas ficam empacadas”.
Leow e suas colegas exploraram diferenças e semelhanças nos padrões de conectividade cerebral em 24 indivíduos com peso-recuperado, com diagnóstico de anorexia nervosa (participantes atenderam a todos os critérios de anorexia, exceto por amenorreia, e todas tinham índices de massa corporal (IMC) de 18,5 ou superior), 29 participantes com transtorno dismórfico corporal e 31 participantes saudáveis em um grupo de controle. Nenhuma estava em medicação psiquiátrica no momento do estudo. Insight e nível de contato com a realidade (delusionality) foram medidos usando-se questionários especializados.
Leow disse que os critérios de seleção para participantes foram escolhidos cuidadosamente, por causa dos impactos profundos que a inanição de longo prazo provoca no cérebro e que poderia contribuir para conectividade anormal nas redes cerebrais.
“Não estudamos indivíduos que estavam muito abaixo do peso no momento, porque não queríamos que a inanição ativa impactasse nossos resultados”. “Nesses casos, não estaríamos realmente com certeza se as anormalidades de rede eram causadas pela própria doença, ou se elas simplesmente refletiam efeitos atuais de inanição no sistema nervoso central”.
As pesquisadoras fizeram imagens do cérebro de cada participante usando ressonância magnética estrutural e imagem ponderada de difusão. Em seguida, elas construíram mapas para cada participante, que mostravam que áreas do cérebro exibiam níveis elevados de conectividade.
Elas descobriram que a conectividade no cingulado caudal anterior e no cingulado posterior eram fracamente conectados com o resto do cérebro naquelas com anorexia nervosa, se comparadas a participantes saudáveis. Participantes com os piores escores de insight apresentavam a pior integração nessas áreas do cérebro.
As pesquisadoras descobriram também que indivíduos com anorexia nervosa apresentavam redes cerebrais anormais, que se sobrepunham às redes cerebrais envolvidas em recompensa e comportamentos compulsivos.
“Isso pode relacionar-se à observação que muitas anoréxicas experienciam um sentimento recompensador de fazer exercícios compulsivos com “sucesso”, bem como na restrição e no alcance de objetivos específicos de peso”, conclui Leow. Participantes com transtorno corporal dismórfico mostraram anormalidades semelhantes, mas menos marcantes nas mesmas regiões cerebrais.
O aprimoramento da habilidade de anoréxicas de detectar a disparidade entre suas percepções e a realidade pode ser a chave para auxiliar algumas a se recuperarem, disse Leow.
“Podemos ensinar insight a essas pacientes usando ferramentas diferentes ou por meio de técnicas, incluindo tecnologias virtuais ou de realidade expandida”, afirmou Leow.
“Uma abordagem em potencial seria ‘ampliar’ os sinais de erro. Muitas pacientes anoréxicas com baixo insight são capazes de entender o comportamento restritivo severo de outra pessoa como perigoso para aquela pessoa, mas não conseguem ver que estão fazendo exatamente o mesmo”, finaliza Leow. Prover sinais visuais de feedback melhores poderia ser um caminho para que as mensagens de erro fossem consideradas.
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Traduzido pela equipe do Espaço da Mente